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7 de jan. de 2012

Ortinho e a saudade do mundo sem rancor

Pernambucano ventricular de amplo espectro, o músico coloca caleidoscópios pelos enquadramentos de seu clipe Saudades do Mundo, canção retirada do disco Herói Trancado, de 2010. Álbum que desacopla as experimentações mais lisérgicas, sangrias valencianas seminais e redescobre uma quase nova Jovem Guarda dos anos binários. Essa não dissonância simplista de pop doce chiclete inesquecível, torna-se mais do que bem vinda em todo o vídeo.
Um homem renascido mitologicamente das águas no poluído Capibaribe, que resolve apresentar-se aos passantes enquanto amalgama-se as paredes amarelas com seu o walkman recoberto em lama da beira do rio. No meio desse úmido resto de arte do mangue, Ortinho conversou com o Nego Dito.
A ideia sobre como deveria ser a mini película, fervia os corações do cantor e de Bidu Queiroz, o diretor, desde o Carnaval. Um olhar diferente sobre Recife, distanciando-se do manguezal. Sem nenhuma cena recoberta de clichês, que poderiam servir como anteparo, já que a história musical local é além de viva e pulsante atualmente, berço do último original movimento dentro da brasilidade. Mas aqui a homenagem é gradual, simples e na veia. Uma modernidade em moldes Allen pulsa por entre a câmera. Ortinho confunde quem vê e liberta-se no mais puro ar de refinarias dos trilhos.
Lúdico e vivo, incerto e preciso.
Um registro simples da evolução natural no som desse músico, encaixando-se sem moldes bancarrotos. Como todo bom pseudópode, registrando os códigos modernos nessa homenagem musical à Pernambuco. Mesmo com a participação de Jorge Du Peixe, comparsa dos tempos de Chico Science, não é para Ortinho uma regurgitação do manguebeat. O compositor da visceral Sangue de Bairro, olha para o que virá e sabe que é de suma importância a retomada que existe hoje dentro do cenário roqueiro popular brasileiro.
Pessoas como Junio Barreto (a entrevista com ele na Nego você pode ler aqui) e outras dezenas de compositores que nesses tempos tem a coragem de fazer com que a cara da música nacional mude sua face. Fazendo das influências dinossáuricas mpbsísticas dos anos 70 não apenas uma citação, mas sim ponto de partida para uma evolução em lava que escorre pelas paredes sonoras sônicas tupiniquins. Uma revolução silenciosa que tem em Science o Boson de Higgins, uma revolução da qual Ortinho faz parte. Colocando canções descontruindo o preconceito de quem escuta, mas não ouve.
Wharton (seu nome de batismo) pensa que antes da polêmica barata, incitada por curiosos, o que deve ser feito nesse momento é incentivar quem faz das canções sua vida. Quem batalha nesse front sem lei e cavalga sem sela midiática ou monetária. Pesquisar quem são esses nomes e de onde vem. Não interessa quem disse o que, mas sim quem é capaz de transcender a moeda fácil do preconceito.
Com ecos do cineasta Claudio Assis, esse amarelo manga que aparece nas paredes por onde passa Ortinho do Capiraribe, é quase um soneto. Desmatelando o blues do desconhecimento e reverberando uma boa nova aos povos indígenas computadorizados do Brasil. Assumir a mudança reutilizando o passado, como diria Chico, é uma evolução musical.