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16 de jan. de 2012

O homem que ver com os ouvidos



Irlandês é considerado um dos primeiros ciborgues do mundo  
Ele não consegue ver cores por conta de uma doença chamada acromatopsia, que faz com que todas as imagens para as quais olha fiquem pretas e brancas. Mas o artista Neil Harbisson deu um jeito de fazer seu mundo não ficar apenas em tons de cinza. Ele criou um equipamento que identifica freqüências de cores e as converte em freqüências de áudio, despejadas por um chip no seu crânio. As reverberações e sons indicam quais são as cores que estão na frente do equipamento. Após anos de treinamento, seu cérebro sabe quais sons significam ao todo 360 tonalidades. Mas ele não parou por aí. Harbinsson criou a Cyborg Foundation, e começa a ajudar outras pessoas a viabilizar ideias simples de conexão entre seres humanos e máquinas para criar novos ciborgues. 



Como foi que se tornou um ciborgue?

Eu nasci com um problema de visão chamado acromatopsia, o que faz com que eu só consiga ver em preto e branco, em escalas de cinza. Quando estava estudando composição musical na Inglaterra, fui a uma conferência sobre cibernética e descobri que poderia usar a tecnologia para estender os sentidos, e foi aí que eu fui falar com o cara que estava dando a conferência. Eu expliquei que só podia ver em branco e preto, e perguntei se ele não poderia começar um projeto para que eu pudesse perceber cores de alguma maneira. Foi aí que começamos esse projeto. 


Você já era um artista antes do eyeborg?

Sim, eu estudei composição musical e pintava, mas só em escalas de cinza. Não usava cores. 


E com o aparelho, você agora pinta usando cores.

Sim. Mas, não é a coisa mais importante que mudou. O mais importante é que agora eu posso perceber cor de alguma forma com meus sentidos. Cor é algo que você usa todos os dias em situações normais. É algo cultural, que as pessoas às vezes não percebem. Está em todos os lugares. Em todos os livros, a cada duas ou três páginas há uma palavra de uma outra cor, ou num mapa, ou numa conversa normal, o nome de uma cor sempre aparece. Antes do dispositivo, isso não significava nada para mim. Agora, eu tenho o meu próprio significado do que são as cores.
Lembra de situações onde não poder ver cores representou um problema?
Muitas pequenas situações. Quando você tem uma pia e um torneira. O azul indica água fria e o vermelho água quente. Vendo só em escalas de cinza, não conseguia identificar qual era qual. Bandeiras de países também eram bem difíceis de entender. As da Itália, França e Irlanda, por exemplo, se você vê em escalas de cinza, são iguais. 


Como funciona o aparelho?

Eu tenho um sensor frente dos meus olhos que detecta freqüências de cores e me dá uma nota musical para essa frequência. Por exemplo, a cor vermelha corresponde à nota Fá. Um chip atrás da minha cabeça converte as informações em sons e que transmite o som diretamente para os ossos, e eu consigo ouvi-los. 


Quantas cores você consegue ver desta forma?

360. Vejo 30 variações de vermelho, 60 azuis e muitas pequenas variações deles. É como se fosse uma roda de cores de 360o e há uma variação de som que eu identifico para cada cor. Depois de anos praticando com o aparelho eu já consigo identificar infravermelho e ultravioleta duas freqüências não captadas pelos olhos humanos. A intenção é expandir cada vez mais a gama de cores que eu posso perceber. 


Isso não requer que você tenha um sentido auditivo muito apurado?

É só praticar. Você não precisa ter um bom ouvido para isso. Você só precisa usar o aparelho e praticar. Por exemplo, na música nós só temos 12 notas. Enquanto eu tenho 360 cores. Se você sabe um monte de música não importa porque você terá que identificar sons com muito mais precisão. Você só precisa treinar o seu cérebro. 


Durante quanto tempo?

Eu comecei com apenas 6 cores. Em poucos dias eu entendi as diferenças. E depois, eu precisei expandir mais e me tomou 5 meses para ouvir. Ouvir as 360 cores foi depois de alguns anos de treino, e eu pratico constantemente e estendendo mais e mais. 


Alguém mais usa esse aparelho?

Não, mas há pessoas que usam de vez em quando o chip com as informações que eu coloco na internet. 


Porque você se considera o primeiro ciborgue?

Quando o governo britânico não me permitiu renovar o passaporte em 2004, comecei uma campanha para fazer com que o governo aceitasse o aparelho eletrônico como parte do meu corpo. Me tornei um ciborgue quando, finalmente, o governo reconheceu. Isso porque a legislação britânica não permite que você apareça com qualquer aparelho em uma foto oficial, por isso tive de brigar, justificando que isso fazia já parte do meu corpo. Meu médico enviou uma carta para dizendo que eu me tornei um ciborgue e que tinha um chip no meu cérebro, e depois de alguns meses, o governo aceitou. 


O que é a Cyborg foundation?

Eu recebia muitos emails de pessoas que também queriam expandir as suas habilidades e seus sentidos por meio de tecnologia. Então criamos uma fundação para ajudar as pessoas a se tornarem ciborgues. Temos diferentes projetos durante o ano onde ajudamos pessoas a se tornarem ciborgues ou ao aumentar os seus sentidos aplicando tecnlogia a partes dos seus corpos. 


Quais são os projetos?

Por exemplo, há uma mulher [Moon Ribas] que está desenvolvendo o sentido da velocidade. Nós não temos nenhum sentido exato da velocidade, nós só sabemos se estamos em um movimento rápido ou devagar, mas sem a velocidade exata. Ela tem um detector de movimento na orelha e quando há um movimento na frente dela, ela tem um input em cada orelha e, dependendo desse input, ela sabe a velocidade exata do corpo se movendo em frente a ela. 


Quantas pessoas vocês já ajudaram?

Demos também o eyeborg [dispositivo criado por ele para ver cores] para pessoas cegas, que lembram de como são as cores quando eles as vêem. Tem também um garoto que veio à fundação que não tinha um dedo. Ele colocou no lugar do dedo uma câmera para tirar fotos com suas próprias mãos. É uma habilidade que ele estendeu porque ele trabalha em artes visuais. A câmera está acoplada ao corpo, como um dedo prostético, mas com uma câmera dentro. 


Número de pessoas? Foram 4 projetos individuais, mas não sabemos quantas pessoas poderiam criar um olho eletrônico individual. 



Quem paga isso?

Não temos financiadores. O custo dos materiais é baixo, nós na verdade ajudamos as pessoas a desenvolver os equipamentos. Não são equipamentos caros. Quando precisamos de dinheiro para projetos específicos, fazemos crowdfunding. Estamos fazendo um projeto de crowdfunding para dar olhos eletrônicos a crianças cegas do Tibete, por exemplo. 


Quais são as suas metas para a fundação?

Queremos criar pequenos cyborg foundations pelo mundo para ajudar pessoas de outros países a se tornarem ciborgues. É importante dizer que não queremos reparar pessoas. Não queremos usá-los para curar problemas, mas para aumentar capacidades humanas. 


Já há alguém interessado?

Já tem um lugar no Equador onde as pessoas estão se organizando para formar uma cyborg foundation.

Galileu