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5 de jan. de 2012

Magnus Carlsen: Gênio do xadrez treinado pelo computador

Líder do ranking mundial, esse jovem-prodígio do xadrez mostra perfeitamente como a genialidade pode ser turbinada na era digital.


O norueguês Magnus Carlsen completará 22 anos dia 30 de novembro. Mas, em dezembro de 2009, já garantira o seu lugar na história ao se tornar o mais jovem enxadrista a chegar ao topo do ranking mundial.
Fato que foi consumado ao fazer um ponto a mais que o número 1 anterior da época, o russo Vladimir Kramnik, no torneio magistral de Londres, com 19 anos e 32 dias de idade.
Antes dele, os mais jovens jogadores a atingir essa colocação foram o americano Bobby Fischer, com 21 anos, e o russo Garry Kasparov, aos 22.
Curiosamente, Carlsen gosta mesmo é de futebol. Fã de Ronaldo e Roberto Carlos e torcedor do Real Madrid, gosta de ver futebol na TV e como muitos garotos normais, gosta de jogar bola.
Eu sigo futebol na TV o tempo todo, especialmente os campeonatos da Espanha e da Inglaterra. Sou torcedor do Real Madrid, muito fã do Ronaldo e do Roberto Carlos. Acho que até teria sido um bom jogador, mas acho que estou bem no xadrez. Está valendo a pena, porque estou criando umas coisas legais. Magnus Carlsen para o Globo Esporte.



Além disso, diferente do estereótipo do nerd de QI alto mas antissocial, ele já é uma espécie de popstar do xadrez. Com um jeitão de Gênio Indomável, Carlsen viaja o mundo todo como garoto-propaganda de uma multinacional de roupas, e de quebra passeia na companhia de atrizes de Hollywood e coleciona milhares de seguidores nas mídias sociais.

Em 2010, você estrelou uma campanha da grife alemã G-Star. Por que aceitou o convite?
Não é uma oportunidade que os enxadristas geralmente têm. Não dava para recusar. Magnus Carlsen, em entrevista à Folha

Seu pai, Henrik Carlsen, um aficionado por xadrez, via algumas habilidades no filho desde cedo, resolveu pegar um tabuleiro e tentar ensinar Magnus. A princípio, sem sucesso, pois aos 6 anos, o garoto não quis nem saber daquele jogo entediante, gostava mesmo era de jogar bola diariamente. Vendo a falta de interesse, o pai resolveu não insistir naquela oportunidade.
Magnus tinha algumas habilidades que nos chamavam a atenção. Ele conseguia montar quebra-cabeças de 50 peças antes dos 2 anos. Com 4 ou 5, montava coisas fabulosas com Lego. Ele tinha uma habilidade incrível de concentração, de ficar focado em alguns tópicos por bastante tempo. Henrik Carlsen. Pai de Magnus.
Por volta dos 9 anos de idade, espontaneamente,  Magnus começou a se interessar e a jogar xadrez. Só que no computador, nada de tabuleiro (até hoje Magnus nem sabe se tem um tabuleiro em casa). E o pai o apoiou:
O computador é uma grande ferramenta para o aprendizado. Ele usava o computador para várias outras coisas, e se sentiu confortável naquele ambiente. Os programas para jogar xadrez começaram a aparecer nos anos 90, justamente na geração dele. Henrik Carlsen.
É claro que o computador tinha algumas vantagens sobre o xadrez analógico que seu pai tentara introduzir na vida de Magnus. Com o computador ele poderia jogar partidas com gente do mundo todo, desafiar amigos e estudar lances. Com esses atrativos (e com a maturidade) o jogo já não parecia mais tão paradão. Ainda que nessa época o menino só pensasse em vencer suas maiores rivais: as irmãs mais velhas.
Entre os 9 e os 10 anos, ele começou a passar várias horas do dia jogando e estudando xadrez. Mas não como uma obrigação, nunca pedimos nada. Era um hobby. Ele tinha essa vontade. Primeiro, queria ganhar das irmãs. Depois começou a estudar para me derrotar. E asssim foi. Henrik Carlsen.
Seu processo de formação difere do processo dos grandes mestres do passado. É comum que grandes jogadores de xadrez participem de seus primeiros torneios aos 6 anos e se tornem jogadores em tempo integral aos 12. Mas Carlsen é um tipo de gênio diferente. Nascido em Tonsberg em 1990, o primeiro torneio de Magnus Carlsen foi o campeonato nacional de 1999, ainda aos 9 anos. Porém, ele não deixou o hobby atrapalhar os estudos e adaptou a agenda de competições de acordo com a escola. O que torna o seu recorde ainda mais impressionante.

O brasileiro Gilberto Milos, um dos Grandes Mestres do xadrez, opina sobre as mudanças ocorridas com o tempo:
Enquanto nós nos espelhávamos nos melhores jogadores do mundo, como Boby Fischer, e analisávamos as partidas dele, ele se espelha no melhor jogador de hoje, que é o computador, devido à capacidade de cálculo. O computador é melhor porque calcula mais, então ele desenvolve mais esse lado e de alguma forma chega próximo da capacidade de cálculo do computador. Não é igual, mas ele tira uma vantagem disso. Gilberto Milos. Enxadrista brasileiro.
Seguindo essa lógica, Magnus Carlsen começou aos poucos a pensar como um computador. E foi desenvolvendo  uma notável capacidade de calcular e memorizar. Estima-se que ele memorize cerca de 500 mil jogadas. E que também seja capaz de enxergar 20 lances à frente. E parece fazer isso de forma muito instintiva.
Eu nunca tive mesmo um jeito científico de estudar xadrez. Eu simplesmente seguia minha curiosidade, minhas ideias. Acho que isso foi muito importante. Magnus Carlsen.

Foi dotado de toda essa habilidade que ele enfrentou Anatoly Karpov, o melhor jogador do mundo por dez anos, e venceu, surpreendendo a todos. O próximo desafio foi encarar aquele que é considerado até hoje o melhor de todos os tempos:  Garry Kasparov, líder do ranking entre 1985 e 2005 e dono das mais altas pontuações internacionais do xadrez.
Tomando suco de laranja, dando uma voltinha enquanto esperava a jogada do Pelé do xadrez, Magnus conseguiu um empate contra o gênio do esporte, e parece que assustou Kasparov. Que a partir dali o tomou como um pupilo.
Depois desse jogo o Kasparov foi embora correndo, nervosíssimo. Mas depois mandou um de seus livros autografados para a nossa casa e disse que podia dar umas aulas, uns conselhos a Magnus. Ele não se interessou muito no começo, mas tempos depois se deu conta que Kasparov sabia muito, muito mesmo. E que poderia ajudá-lo. Henrik Carlsen. Pai de Magnus.
Foi bom para Magnus não rejeitar os conselhos do velho Mestre. Afinal, Carlsen não vivenciou a importância dos embates entre Kasparov e Karpov nos anos 80, nos tempos da Guerra Fria, onde xadrez era tratado como assunto de Estado (embora ambos fossem russos, Kasparov era opositor ao regime soviético). Talvez ele só se lembre da última cartada do humanidade versus inteligência artifical, quando Kasparov tentou, inutilmente, derrotar um supercomputador (o célebre Deep Blue).

Com isso, Carlsen ganhou um grande tutor, talvez o melhor deles. O russo também é adepto do uso de  computadores e sabia utilizá-los para analisar jogos e melhorar o desempenho. E ensinou Carlsen a usar melhor a máquina o qual foi aprimorando a técnica até se tornar o número 1 do ranking da federação internacional.
Fiquei mais agressivo. E isso foi decisivo para vencer os melhores do mundo. Magnus Carlsen.
Segundo Magnus, a parceria entre ele e Garry durou até 2010 (pouco mais de um ano) e hoje eles ainda mantêm boas relações.
Mas a pergunta que fica é: como Magnus consegue analisar e memorizar tantas jogadas? Ele não é um autista savant. E tampouco se considera um filho da era da computação. Nem mesmo se considera um gênio.

Na teoria, quando um jogador comum pensa para fazer um lance no xadrez, ele usa apenas o lado esquerdo do cérebro. Já os grandes jogadores, como Magnus, conseguem usar os dois hemisférios, obtendo o dobro da capacidade de raciocínio e memorização. Por isso é possível calcular e memorizar tanto.
Você olha para o tabuleiro em um jogo dele e diz: não existe saída, está acabado. E aí, logo depois, Magnus escapa, com algo que ninguém havia pensado. Parece simples, mas é incrivelmente difícil fazer isso em um jogo de xadrez. Poucas pessoas têm esse talento: escolher precisamernte a jogada certa e fazer o que ninguém havia imaginado. É o que o Magnus faz. Dirk Geuzendam. Especialista em xadrez.
De qualquer forma, os cientistas têm um caso formidável que pode trazer avanços para a ciência da cognição e o xadrez obteve um fenômeno para renovar o interesse pela modalidade.
Fonte: SporTV, Galileu, Wikipedia, WhyChess (em inglês), YouTube




Via BBA